Desenvolvimento desordenado é uma das causas de enchentes em SP
A
chuva que atingiu a capital paulista neste mês de fevereiro tem causados
transtornos para a população, que sofre com enchentes, deslizamentos e
congestionamentos. Nos primeiros 11 dias do mês, as chuvas na cidade ultrapassarem em
37,2% a média histórica para fevereiro. Segundo o Instituto Nacional de
Meteorologia (Inmet), choveu neste mês 342,6 milímetros. A média para fevereiro
registrada entre 1981 e 2010 ficou em 249,7 milímetros.
O Inmet registrou, na segunda-feira (10), 114 milímetros de precipitação na
Estação do Mirante de Santana, zona norte da cidade. Este foi o segundo maior
volume de chuva em São Paulo para um mês de fevereiro, em 24 horas, em 77 anos.
Para o gerente de Economia da Biodiversidade da Fundação Grupo Boticário, o
engenheiro florestal, André Ferreti, o fenômeno é resultado da chamada mudança
climática junto ao desenvolvimento desordenado que ocorre nas grandes
metrópoles.
“Juntamos a mudança climática com esse efeito da ilha de calor, que é causado
por essa grande região metropolitana cheia de concreto e cimento. Vemos também
todo o problema da canalização dos rios, a ocupação de leitos de rios, de áreas
de banhados – que seriam áreas inapropriadas para construção das casas, das
infraestruturas públicas e privadas. Acabamos invadindo áreas em que
naturalmente o excedente de água se concentrava, aí temos essa situação
caótica”, disse Ferreti. Essas eram áreas que recebiam o excedente de água e
que tinham a capacidade de funcionar quase como uma esponja, no entanto, foram
impermeabilizadas com concreto e asfalto.
Solução
Para reduzir as consequências das chuvas intensas, como as que atingiram a
capital paulista na última semana, Ferreti apontou soluções que permitam o
armazenamento da água e outras que possibilitem maior permeabilidade do solo.
“Precisamos pensar no nosso município, nosso bairro, de forma a ampliar o poder
de absorção desse excedente de água. Precisamos [pensar] nas estruturas cinzas,
que são as estruturas de concreto – como os piscinões, as galerias pluviais,
todo esse sistema de drenagem – que precisa ser ampliado, porque está vindo
mais água do que vinha historicamente e eles não foram dimensionados para esse
volume tão grande de água em um período de tempo muito curto, então não dão
mais conta de escoar tanta água”.
Ferreti diz que para tornar o solo da região mais permeável é preciso ter mais
praças, arborização urbana, áreas verdes, ter telhados verdes, que são
alternativas que poderiam ser utilizadas em toda a cidade. “Podemos ter
cisternas, que coletam essa água da chuva e evitam que ela escoe rápido para
esses pontos mais baixos e, ao mesmo tempo, permite que os moradores, as
pessoas possam utilizar essa água para diversos fins”.
Outro exemplo citado pelo engenheiro são pavimentos mais permeáveis, feitos de
pequenos blocos de concreto, em vez de uma grande área cimentada, além de novas
tecnologias que produzem um asfalto permeável. “Hoje existem até asfaltos que
permitem que a água penetre. São asfaltos permeáveis, assim como tipos de
pavimentos que podemos colocar nas calçadas ou no entorno das casas que
permitam infiltração de água. Por exemplo, uma rua de blocos de concreto ou de
paralelepípedo permite a entrada de água entre as pedras ou entre os blocos de
concreto”.
Para o engenheiro, essas técnicas, sejam elas de infraestrutura natural – como
praças, áreas verdes, parques e arborização urbana – ou tecnologias que podem
ser utilizadas na infraestrutura cinza – que são as casas, o asfalto, a
calçada, as lajes – têm que ser combinadas e pensadas de uma nova forma para
que se possa aproveitar essas tecnologias para diminuir o impacto desses
eventos climáticos extremos.
Poder público
Ferreti avalia que o poder público pode agir, incentivando o uso dessas
tecnologias e proibindo construções que tenham impacto negativo para a cidade
como um todo. “A gente poderia ter, por exemplo, leis que exigissem isso em
determinadas zonas das cidades. Dentro do plano diretor da cidade, a gente
poderia ter regras bem claras tanto para cisternas que coletam água da chuva
quanto para telhados verdes [similares a canteiros em cima das construções]
para construções acima de uma determinada metragem”, sugeriu.
O engenheiro ressalta que, a todo momento, há construção de novos bairros e que
as cidades estão se expandindo. “Isso precisa estar na consciência dos
empreendedores, mas também precisa estar nas políticas públicas que incentivem
a adoção disso e, em alguns casos, que obriguem esse tipo de estratégia. Você
tem que inibir algumas práticas e incentivar o uso de outras que são mais
adequadas, então tem que falar ‘é proibido impermeabilizar todo o terreno’, uma
porcentagem dele tem que ter grama, telhado verde e você vai conduzindo isso
com leis, impostos, benefícios”, disse. “Se o governo não quiser dar
benefícios, ele vai gastar muito com essas calamidades que a gente está vendo,
que geram prejuízos muito maiores para a cidade, desastre, perda de vidas”.