Grupo tenta impedir missa com música africana e ofende negros no Rio
Uma
missa celebrada na última
quarta-feira, 20, em homenagem ao Dia da Consciência Negra numa
igreja da Glória (zona sul do Rio de Janeiro) terminou na polícia.
Um grupo tentou impedir a celebração e atacou fiéis com frases
racistas. Até o padre foi acusado de ser pecador por permitir a
celebração. Um fiel que diz ter levado um tapa de um integrante
desse grupo registrou o caso na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos
de Intolerância (Decradi) nesta quinta-feira, 21.
A celebração
é realizada há 15 anos na Igreja do Sagrado Coração de Jesus, na
rua Benjamin Constant, e segue o rito católico tradicional. A única
diferença é a inclusão de cantos e danças africanas, com o uso de
instrumentos musicais próprios, como atabaques.
Segundo
testemunhas, pouco antes da missa um grupo com cerca de 20 pessoas
chegou e se dirigiu ao padre, tentando dissuadi-lo de celebrar a
missa, que segundo eles desrespeitava o ritual católico. Os homens
usavam ternos e as mulheres, vestidos e véus Até a noite desta
quinta-feira os nomes deles não haviam sido divulgados.
Segundo
relatos de testemunhas, o grupo disse que tinha ido até a igreja em
nome do cardeal d. Orani Tempesta, arcebispo do Rio de Janeiro, mas
em seguida foi confirmado que não havia nenhuma ligação ou
determinação do cardeal aos manifestantes.
O padre não
atendeu ao pedido e iniciou a celebração, durante a qual um outro
padre fez discurso em que ressaltou que não estavam fazendo nada
errado ao incluir na missa os cantos e danças africanos.
Testemunhas
relatam que o grupo então passou a rezar o terço em latim, em voz
alta, na tentativa de atrapalhar a celebração. Ao final da missa,
os manifestantes acusaram o padre de cometer pecado ao permitir
aquela celebração e recomendaram que ele “cuidasse de suas
ovelhas negras”, numa referência à cor da maioria dos fiéis
que prestigiaram a missa. Houve tumulto e a Polícia Militar foi
chamada. Em meio ao tumulto, os manifestantes acusaram fiéis de
injúria (crime que consiste em ofender alguém fazendo acusações
falsas para atacar sua dignidade ou decoro).
Nesta última
quinta-feira, 21,
o professor Diogo Pinheiro, que é negro e pai de participantes da
apresentação artística de origem africana, foi à Decradi para
relatar o caso e acusar os manifestantes pelos crimes de racismo e
intolerância religiosa e pela infração de vias de fato.
“Ele
relatou ter levado um tapa de uma pessoa que havia tentado
interromper a missa”, contou o advogado Rodrigo Mondego,
integrante da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do
Brasil no Rio de Janeiro (OAB-RJ). Mondego acompanhou o depoimento de
Pinheiro ao delegado.”Outras vítimas vão depor nos próximos
dias. É preciso punir esses racistas, um grupo de fundamentalistas
religiosos que não conseguiu impedir a celebração e então decidiu
tumultuar”, disse.
A Igreja Católica não havia se
manifestado sobre o episódio até as 21h desta quinta-feira. Em
nota, a secretaria estadual de Desenvolvimento Social e Direitos
Humanos afirmou que, embora não tenha sido procurada por nenhum dos
envolvidos, contatou a paróquia e está agendando uma reunião para
propor uma série de debates e palestras sobre liberdade religiosa.