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Profissionais falam das dificuldades e virtudes em ser médico

Hoje, comemora-se o Dia do Médico. O Primeira Página traz entrevistas de dois médicos e uma médica como uma homenagem

18/10/2020 08h27 - Atualizado há 4 anos Publicado por: Redação
Profissionais falam das dificuldades e virtudes em ser médico Fotos: Divulgação

O Dia do Médico deste ano, celebrado neste domingo (18), terá de ser comemorado de forma diferente em função da pandemia do novo coronavírus. Profissionais que têm como marca registrada o contato com as pessoas para tratar, cuidar e prevenir doenças, neste 2020, os médicos precisam ser celebrados mais do que nunca. Para marcar a data, o jornal Primeira Página (JPP) conversou com o Dr. Luiz Oliveira, nefrologista e médico intensivista da UTI Covid da Santa Casa de São Carlos, com a Dra. Alice de Queiroz Constantino Miguel, médica em Clínica Médica do Hospital Universitário da UFSCar Prof. Dr. Horácio Carlos Panepucci (HU-UFSCar) e com o Dr. Ivan Linjardi, urologista e vice-presidente da Unimed São Carlos.

A nossa reportagem encaminhou as mesmas perguntas para os três profissionais da saúde e a seguir as respostas completas dos médicos Oliveira, Alice e Linjardi.

Luiz Oliveira, nefrologista e médico intensivista da UTI Covid da Santa Casa

JPP: O que é ser médico?

Dr. Oliveira: Ser médico é decifrar a necessidade do outro, vai além do diagnóstico de tratar a dor. É entender o porquê da dor, da doença, e saber ajudar. Dando conforto, sendo amigo, sendo confidente do seu paciente.

JPP: Por que o senhor escolheu a medicina?

Dr. Oliveira: A vida me levou ao caminho da Medicina. Eu comecei a me interessar pela profissão, quando, ainda criança, tinha curiosidade de entender como o nosso corpo funciona. E sempre tive uma vontade muito grande de querer ajudar. E quando você passa a exercer a profissão, tem que aprender a lidar com a responsabilidade de ser médico. Já que muitas vezes, o paciente que está nas nossas mãos, não tem escolha e só pode contar com o seu médico.

JPP: O que é preciso para ser um bom médico?

Dr. Oliveira: É necessário ter um bom conhecimento técnico e sempre buscar pelas atualizações, continuar buscando capacitação constante. Mas, principalmente, saber escutar o paciente, saber a melhor forma de explicar a doença ao paciente e à família. Fazer com que eles se sintam acolhidos. Tudo isso, em conjunto, é que forma um bom médico.

JPP: Durante a sua carreira o senhor já teve que escolher entre a vida ou a morte de um paciente?

Dr. Oliveira: A gente sempre batalha e faz o melhor para garantir a vida. O que acontece com frequência, é termos que lidar com pacientes terminais, casos graves, incuráveis, em que a intervenção médica já não pode garantir uma sobrevida maior. Nesses casos, sempre em comum acordo com a família, buscamos as alternativas mais viáveis para os cuidados paliativos.

JPP: Na pandemia, qual foi o momento mais difícil?

Dr. Oliveira: O início foi o mais difícil. Todos nós enfrentamos o medo do desconhecido. Quando a doença ainda não tinha chegado à nossa região, não sabíamos se e quando a COVID-19 chegaria e se teríamos leitos suficientes para cuidar de todos os nossos pacientes. Outro momento muito difícil para mim, foi quando tratamos de pessoas da mesma família, com o mesmo diagnóstico, internadas lado a lado.

JPP: Na sua opinião a pandemia valorizou ainda mais a carreira do médico?

Dr. Oliveira: Não digo uma valorização, mas um resgate do respeito à profissão. Nós, médicos, mostramos que honramos o nosso juramento, nos expondo a uma grande doença, com um grande risco de contaminação. Vejo colegas com fatores de risco, comorbidades na linha de frente e nos bastidores, ajudando todos os pacientes, apoiando familiares e ajudando outros colegas. Com isso, voltamos a ser respeitados.

JPP: O que ainda falta para que o médico chegue para todos?

Dr. Oliveira: Acredito que todos os médicos têm o desejo de atender de melhor forma os seus pacientes. Aqui na Santa Casa, a gente conta com uma estrutura e com a parceria de colegas qualificados, que nos permitem oferecer um tratamento adequado aos pacientes. Mas em muitas Instituições, ainda falta infraestrutura, um plano de carreira e respeito aos profissionais.

Dra. Alice de Queiroz Constantino Miguel, médica em Clínica Médica do HU-UFSCar

JPP: O que é ser médico?

Dra. Alice: É uma escolha profissional e pessoal por completo. É dedicação, é responsabilidade, muito estudo, trabalhar em equipe e saber se comunicar. Vem junto com tudo isso, obrigações, e que me traz muitas realizações e sentido na vida.

JPP: Por que a senhora escolheu a medicina?

Dra. Alice: Porque gosto da matemática, de lógica de conversa e de toque. Sempre fui boa em cuidar dos outros, sempre fui estudiosa. Tenho um pai muito querido médico, e assim pude escolher o que queria com base em evidências que tinha em casa, e tive todo apoio necessário para atingir os meus objetivos.

JPP: O que é preciso para ser um bom médico?

Dra. Alice: Para ser um bom médico exige dedicação, responsabilidade, competências especificas, muito estudos e treinamento. Precisa ser valorizado, ser respeitado e sempre lembrar, para cuidar bem precisamos estar bem. Por isso, necessitamos de saúde física e mental, e qualidade de vida.

4JPP: Durante a sua carreira a senhora já teve que escolher entre a vida ou a morte de um paciente?

Dra. Alice: Não cabe a nós médicos ou a qualquer profissional de saúde a escolha da vida ou da morte de um paciente. Nós somos preparados para dar toda a assistência para a vida e qualidade de vida ao paciente e toda assistência para uma boa morte.

JPP: Na pandemia, qual foi o momento mais difícil?

Dra. Alice: Pandemia teve vários momentos difíceis e ainda tem, mas acho que o pior momento foi no início de março quando o coronavírus chegou em São Carlos e aqui ainda estava tudo muito incerto e tinha muita insegurança e uma expectativa de um cenário horrível pela frente, era muito angustiante.

Até entender melhor o contexto que a gente estava e as possibilidades do que poderia acontecer, então, decidi sair de casa, fiquei longe dos meus filhos e do meu marido, fora da minha casa, do meu espaço.

Nesse processo de me apropriar de tudo que acontecia, de tudo que eu ia ter que me dedicar e tomando as decisões de que ia atuar na linha de frente, e assumir os riscos e as responsabilidades, era bombardeada por notícias polarizadas, por desinformação no movimento contrário a tudo que eu estava fazendo, então acho que para mim foi o momento mais difícil.

JPP: Na sua opinião a pandemia valorizou ainda mais a carreira do médico?

Dra. Alice: Diria que sim e que não. Sim, pois a gente tem passado por um momento de declínio de prestígio e valorização da profissão e nesse momento foi reconhecido e até ressaltado a importância dos médicos e profissionais de saúde. Ficou claro a dedicação, sacrifício, as dificuldades e os riscos que temos no nosso dia a dia, que faz parte da nossa profissão, inerente à nossa escolha. Mas, não pois não vejo muita diferença entre propostas de proteção de carreira no sentido institucional dos locais de trabalho como hospital, unidades básicas, ambulatórios, laboratórios, e não pois ao mesmo tempo com a mídia e a política interferindo tanto, a gente nunca teve tanta intervenção não técnica na nossa atuação, interferindo na nossa autonomia e não vínculo médico – paciente.

JPP: O que ainda falta para que o médico chegue para todos?

Dra. Alice: Na minha opinião o médico não necessariamente precisa chegar a todos, mas o que precisa chegar a todos é a saúde e a assistência. Que no cenário de promoção e prevenção, um médico muitas vezes tem um papel secundário. Os outros profissionais de saúde fazem um trabalho bem melhor e mais efetivo do que o médico. Então é preciso de políticas públicas e de valorização do SUS e todos os profissionais que atuam nele em todas as instâncias da complexidade que dá assistência à saúde.

Dr. Ivan Linjardi, urologista, e vice-presidente da Unimed São Carlos

JPP: O que é ser médico?

Dr. Linjardi: Ser médico é saber que sua missão é cuidar de pessoas, no sentido mais amplo da palavra cuidar. Ser médico e saber que as vezes é preciso se abdicar de momentos com sua família no final de semana para atender alguém que está precisando naquele momento. É ter que dar a notícia da morte de um filho para sua mãe. E ver um paciente sair bem da UTI após 14 dias de entubação. E ter a oportunidade de ver alguém nascer e dar o primeiro choro. Ou presenciar a recuperação de um recém-nascido prematuro que nasceu com menos de um quilo ir embora para casa nos braços sorridentes de sua mãe. E fazer uma cirurgia de 5 horas e perder seu paciente na mesa de cirurgia. E tirar a dor de alguém com uma simples injeção. É tudo isso. Mas no final das contas médico e um ser humano como qualquer outro , com qualidades e defeitos , mas que se propôs a ajudar outras pessoas como modo de vida.

JPP: Por que o senhor escolheu a medicina?

Dr. Linjardi: Não sei . Em certo momento senti que era esse meu caminho e fui em frente. Sempre tive uma vontade de ajudar as pessoas de algum modo.

JPP: O que é preciso para ser um bom médico?

Dr. Linjardi: Comprometimento verdadeiro com seu paciente. Querer ajudá-lo acima de tudo. Saber que nem sempre conseguiremos salvá-lo ou curá-lo, mas que precisamos ficar ao lado, sempre.

JPP: Durante a sua carreira o senhor já teve que escolher entre a vida ou a morte de um paciente?

Dr. Linjardi: Escolher entre a vida e a morte, não. Mas, já tive que decidir a hora de parar de intervir na ordem natural das coisas, da vida. Muitas vezes a morte é um processo natural da vida. Precisamos ter discernimento para não interferir nesse processo. Ao mesmo tempo tomar decisões rápidas para salvar uma vida que está indo precocemente, faz parte do nosso cotidiano. Nem sempre é fácil diferenciar essas situações. Mas continuamos em frente.

JPP: Na pandemia, qual foi o momento mais difícil?

Dr. Linjardi: Acho que o início foi o pior momento. A incerteza do comportamento da doença na população e toda a insegurança no tratamento dos primeiros casos foi muito difícil. Hoje conhecemos mais a doença, sua maneira de proliferar e seu desfecho.

JPP: Na sua opinião a pandemia valorizou ainda mais a carreira do médico?

Dr. Linjardi: Acho que valorizou o profissional da saúde. Não só o médico.

JPP: O que ainda falta para que o médico chegue para todos?

Dr. Linjardi: Falta uma política consistente de valorização desse profissional. É preciso ter algum estímulo para a classe médica se interessar em atuar nas áreas mais distantes do país. Entende-se como estímulo, um salário digno, condições mínimas de trabalho e plano de carreira. Sem isso vamos continuar tendo regiões carentes de médicos.

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