Rita Lee reedita coleção infantil
Recentemente, Rita Lee lançou
o livro infantil Amiga Ursa – Uma História Triste, Mas Com Final Feliz, com
ilustrações de Guilherme Francini, pela Editora Globo. Rita inspirou-se na
história real de Marsha, a ursa mais triste do mundo, que foi tirada de seu
hábitat, a Sibéria, e passou anos acompanhando um circo pelo Brasil. Marsha
estava num zoo no Piauí quando foi transferida, com ajuda da ativista Luisa
Mell, para um santuário no interior de São Paulo, onde ganhou o nome Rowena e
foi finalmente feliz (ela morreu pouco tempo depois de o livro ser lançado).
Para muitos, essa tinha sido a primeira incursão
de Rita Lee pela literatura infantil, mas, na verdade, a cantora e compositora
de 71 anos, e hoje aposentada dos palcos, já havia escrito para crianças. Entre
1986 e 1992, ela publicou uma coleção infantil chamada Dr. Alex, que tinha como
protagonista outro bicho, um ratinho cientista e pacifista. Defensora da causa
animal, Rita reeditou a coleção, lançada agora pela Globinho, com textos e
desenhos atualizados.
Outro roqueiro, Sir Paul McCartney se aventurou
em escrever para crianças e, em setembro, lançou o simpático livro Hey
Grandude!. De volta aos brasileiros, músicos como Chico Cesar, Emicida e China
também são autores de livros infantis.
Publicada entre 1986 e 1992, a coleção para
crianças Dr. Alex, de Rita Lee, é formada por quatro livros. A série, que ganha
nova edição pela Globinho, volta ao mercado, a princípio, com os dois primeiros
títulos: Dr. Alex e Dr. Alex na Amazônia. Os outros dois volumes da coleção
estão previstos para ser lançados no início do ano que vem. Dr. Alex, o
primeiro volume, mostra a história de cientista alemão defensor dos animais,
que vira um ratinho para escapar de um grupo que não respeita animais nem meio
ambiente. Já no segundo título, Dr.
Alex na Amazônia, o ratinho Alex combate pessoas
malvadas que querem destruir a Amazônia, os bichos e os índios. Após tantos
anos, Rita fala da atualidade do tema. “Curioso que no texto pouco
mexi”, diz a autora, em entrevista ao Estado, por e-mail. Leia a
entrevista na íntegra abaixo.
Foi a descoberta de que ratinhos eram usados
como cobaias que fez você eleger um camundongo como Dr. Alex?
Quando era criança, meu pai me levou ao
Instituto Biológico e fiquei pirada com as cobaias fofinhas e perguntei o
motivo de elas “morarem” lá… Quando me responderam que era para
morrer, eu abri o berreiro e isso ficou na minha cabeça.
O que você acha da tendência, em histórias
infantis, de humanizar os animais que são os personagens, dividindo-os em
mocinhos e bandidos?
Os humanos tratam bichos como coisa e imaginam
erroneamente que as crianças de hoje vão querer fazer o mesmo. Mas basta você
mostrar a elas como os animais são maltratados pelos humanos que entendem que
todas as formas de vida merecem respeito. Crianças e bichos têm a mesma pureza,
são muito parecidos.
Da época em que você publicou a primeira
história do Dr. Alex até hoje, acha que evoluiu o respeito aos animais de uma
forma geral? Ou não?
Hoje em dia, o assunto do respeito aos animais
está sendo muito mais discutido, apesar de ainda existirem horrores como
rodeios, zoológicos, farras do boi, vaquejadas, circos, criadores de cachorros,
etc., etc., etc… Tudo isso um péssimo exemplo para as crianças! Já melhorou,
mas a luta continua.
E como foi escrever para crianças sobre a
causa animal nos anos 1980/90 e como é escrever para esse mesmo público hoje?
As crianças hoje estão mais conscientes?
Para essa criançada que está vindo, que eu chamo
de ‘índigo cristal’ – aquelas que já nascem com uma sensibilidade consciente -,
falar sobre o respeito a todas as formas de vida é uma realidade natural. Quem
tem a cabeça fora da nova ordem são os adultos.
Nessa reedição da coleção ‘Dr. Alex’, por que
você achou importante revisar os textos? E as ilustrações também?
Foram escritos muito tempo atrás. E também
pensei em dar uma atualizada geral com ilustrações modernas e coloridas.
A Amazônia ainda está no cerne do debate
mundial. Como foi revisitar ‘Dr. Alex na Amazônia’ e perceber que muito do que
foi tratado ali ainda é atual? Que adaptações nesse texto você fez para o
relançamento do título?
Curioso que no texto de Dr. Alex na Amazônia
pouco mexi. O que mais mudou foram as ilustrações, feitas em aquarela por
Quilhoma Issac.
De que forma o livro ‘Amiga Ursa – Uma
História Triste, mas com final feliz’ fez você querer resgatar seus primeiros
livros infantis?
Quando soube dos maus-tratos pelos quais a ursa
Rowena passou, achei que seria interessante dividir minha dor com as crianças,
justamente por serem mais sensíveis. E, por diversas vezes, as crianças também
se mantêm caladas diante de um sofrimento, assim como os animais. É uma
história triste e verdadeira, mas que teve um final feliz. Como o Amiga Ursa
fez grande sucesso, lembramos das aventuras do ratinho pacifista dos anos 80.
Aliás, como foi receber a notícia da morte da
ursa Rowena pouco tempo depois do lançamento de seu livro?
O que pensei foram nos dez últimos meses de vida
nos quais ela passou cercada de amor e de cuidados. Já estava velhinha, mas
chegou a conhecer a liberdade e, durante esse pouco tempo, foi feliz.
A capa do ‘Dr. Alex’ lembra a capa do seu
disco ‘Rita Lee’, de 1979. Foi um toque seu? O que achou do resultado final?
Essa sacação foi do meu editor Guilherme Samora
e do ilustrador Guilherme Francini (que ilustrou Dr. Alex). O resultado foi
surpreendente para todos nós. Guilherme Samora foi quem teve a ideia de
reeditar os livros. Quando ainda pequeno, ele colecionava os livrinhos do
ratinho Alex. Agora, como editor da Globo Livros, resolveu relançá-los quando o
assunto está mais atual do que nunca.
Há alguns meses, um quadrinho mostrando dois
rapazes se beijando causou um furor na Bienal do Livro do Rio. O que passou
pela sua cabeça quando soube disso, você que foi pioneira em mostrar um beijo
gay no clipe ‘Obrigado, não’, além de trocar o primeiro selinho com a Hebe, que
tornaria uma marca registrada dela?
Senti um cheiro dos anos de chumbo… Achava que
a essa altura estaríamos mais para The Jetsons do que para The Flintstones.