Série trata sobre o verdadeiro assassino de Malcolm X
Produção da Netflix investiga crime contra o ativista afro-americano
O ativista afro-americano Malcolm X foi assassinado em 1965
quando discursava para uma plateia no Harlem. Foi atingido por 16 projéteis de
calibres diferentes. Um dos autores do atentado foi baleado no local e preso no
ato. Outros dois fugiram e foram detidos depois. Tudo em aparência esclarecido.
Qual então o interesse de uma série intitulada Quem Matou Malcolm X? Disponível
na Netflix?
Acontece que há dúvidas profundas sobre esse crime cometido há 55 anos no
contexto explosivo dos anos 1960 nos Estados Unidos, década em que tanto
Malcolm X como um presidente da República, John Kennedy, e um líder de índole
pacifista, Martin Luther King, morreram de forma violenta.
Malcolm X, ao contrário de King, defendia o confronto para enfrentar a
violência racial. Foi, durante muito tempo, o segundo na organização Nação do
Islã, liderada por Elijah Muhammad. Um dos trunfos da série, talvez o maior
deles, é a riqueza do material disponível. Nele, encontramos a figura
carismática de Malcolm X, imponente em seu 1,90m de altura, inteligente, hábil
com as palavras, convincente, levando o público ao êxtase com sua retórica incendiária.
Perto dele, o líder da Nação Islâmica parece figura apagada.
Diante desse carisma, muitas pessoas da organização suspeitavam que Malcolm X
tentava puxar o tapete de Elijah Muhammad e tornar-se o chefe. Malcolm sempre
negou isso, mas, após anos de colaboração, brigou com Muhammad, deixou a seita
e fundou a sua própria, chamada Organização da Unidade Afro-Americana. Foi
considerado traidor da União do Islã. Afinal, fora Elijah Muhammad quem
resgatara Malcolm X na prisão, o acolhera e o tornara um protegido,
destinando-o a ser seu herdeiro no futuro.
Parecia claro, então, que o crime tinha origem na União do Islã e Elijah
Muhammad seria o mandante, o que ele sempre negou. Enfim, os assassinos foram
detidos e não parecia haver dúvidas razoáveis sobre o caso.
No entanto, o historiador Abdur-Rahman Muhammad, fã de Malcolm X, entende que o
caso continua mal explicado. Examinando documentos variados, da União do Islã e
do FBI, constata que as provas contra os dois presumíveis assassinos, presos
depois do atentado, eram frágeis e contraditórias. O seu exame detido apontava
para um novo personagem, jamais mencionado no inquérito.
Abdur-Rahman torna-se o condutor e mestre de cerimônias da série, dirigida por
Phil Bartelsen e Rachel Dretzin. Ele é quem apresenta as inconsistências do
caso, mostrando novas evidências e, ao mesmo tempo, expondo o contexto febril
das lutas raciais em que o crime se dera. O documentário, com seis partes de
aproximadamente 40 minutos cada, torna-se uma ótima aula de História.
Quem Matou Malcolm X?
Toma forma dupla, de filme de detetive com direito a dúvidas e a suspense,
e ensaio histórico sobre uma época tão violenta como rica na nação
norte-americana e no mundo em geral.
Caso houvesse menos material filmado, a série talvez se tornasse uma monótona
sequência de depoimentos. Mas, pelo contrário, é a riqueza do arquivo que
garante a vivacidade do documentário. Ouvimos muito e vemos tanto Malcolm X
como seu mentor e depois rival Elijah Mohammed. O primeiro arrebatava pelo
charme e coragem; o segundo seduzia por sua discrição de estrategista. Eram
duas concepções diversas no jogo de posições da luta racial norte-americana.
Malcolm, apologista da ação direta, faz uma viagem à África e volta mudado.
Reconcilia-se com o Dr. King e passa a considerar outras táticas, menos
violentas, para a sua causa. Mas não teve tempo de colocá-las em prática ao ser
devorado pela violência da época.