Trinta anos depois, Beth Faria assiste à novela ‘Tieta’ ao lado da neta
Trinta e um anos depois de
interpretar Tieta no horário nobre da TV Globo, Beth Faria está agora maratonando a novela ao lado da neta,
Giulia Butler, durante o confinamento social das duas no apartamento da atriz
no bairro do Leblon, no Rio de Janeiro. Um dos maiores sucessos de audiência da
emissora, o folhetim de 1989 está agora disponível na plataforma GloboPlay.
Beth tinha 42 anos quando interpretou a “cabrita”
que volta triunfante para Santana do Agreste, 25 anos depois de ser escorraçada
de sua cidade natal, na trama inspirada no livro de Jorge Amado. O elenco era
um dream team: Joana Fomm, José Mayer, Reginaldo Faria, Yoná Magalhães, Armando
Bógus, Ary Fontoura, Lidia Brondi e outros.
A abertura da novela também fez história. Assinada por Hans
Donner, misturava elementos da natureza com a beleza da mulher, representada
por Isadora Ribeiro, tendo como pano de fundo as dunas de Mangue Seco, na
Bahia. Tieta já havia sido exibida no Vale a Pena ver de Novo, em 1994, e no
canal Viva, em 2017.
“Tieta representa a derrubada de todos os preconceitos.
O povo está se identificando com ela agora. Todo dia vejo coisas na internet.
Um trabalho que fiz há 30 anos hoje está trazendo coisas boas”, disse Beth
Faria ao Estadão. A novela tinha uma pegada feminista no momento em que o
Brasil respirava a democracia e a liberdade no ano da primeira eleição direta
para presidente após a ditadura militar.
“Nunca me considerei uma feminista, mas li muito cedo,
na adolescência, aos 16 anos, O Segundo Sexo, da Simone Beauvoir. Aquilo deu
uma abertura na minha cabeça”, disse a atriz. A força feminina de Tieta
ajudou a mobilizar o público, que pressionou a Globo a incluir a novela no
cardápio de reprises de sua plataforma de streaming.
Em tempo de #metoo e explosão movimentos contra o assédio,
Beth Faria disse que existe um “machismo estrutural” na televisão.
“O assédio não foi inventado agora. Não sofri assédio, mas passei por
muitos. Se eu disser que sofri me coloco como vítima, e eu não gosto. Passei
por assédios e sobrevivi. As atrizes mais jovens hoje enxergam o assédio de
outra forma. Passávamos por assédios, mas tínhamos vergonha de falar.”
Cilada
Em sua quarentena, Beth Faria tem dialogado frequentemente
com os colegas da classe artística, que estão mobilizados para tentar evitar o
colapso do setor audiovisual. Segundo ela, por volta de 350 mil pessoas estão
desempregadas, e a crise antecede a pandemia do coronavírus. “Parou tudo
há dois anos e meio. O cinema brasileiro precisa destravar. Houve uma
desmoralização dos artistas e do cinema. A população começou a ter antipatia
pelos artistas.”
E por falar em artistas, um tema é inevitável. O que vai ser
da Secretaria Nacional de Cultura sob comando de Mário Frias? Sobre ele, Beth
Faria é sucinta. “Não o conheço. Não sei qual o projeto dele e se ele
tem.” Já Regina Duarte, colega de sua geração na Globo, a atriz conhece
bem. Beth conta que não se surpreendeu com as posições políticas dela, que eram
conhecidas desde o apoio a José Serra na disputa presidencial contra Lula em
2002.
Sobre a breve passagem de Regina pelo governo Bolsonaro, Beth
Faria tem uma explicação: o ostracismo. “Para uma atriz mais velha o
ostracismo tem que ser muito trabalhado psicologicamente Não é igual a jogador
de futebol, que uma hora pifa. A atriz vai tendo menos trabalhos, menos
convites. E quando aparecem, é um papel pequeno.”
Segundo a protagonista de Tieta, um convite como aquele para o
governo pode “fazer bem para o ego” da pessoa. “Quando a pessoa
não tem uma boa formação cultural, pode cair nessa cilada.”