‘A distância entre nós e os países avançados será ampliada’, afirma Glauco Arbix
O fato de a já escassa e
disputada mão de obra brasileira da área de tecnologia estar deixando o Brasil
deve resultar em uma distância ainda maior entre a economia brasileira e as
mais avançadas, segundo o professor Glauco Arbix, coordenador do Observatório
da Inovação do Instituto de Estudos Avançados da USP. Para tentar reverter essa
tendência, segundo ele, é preciso ampliar o centro motor das inovações
“caso contrário, vai gerar uma desigualdade maior entre os países e dentro
deles também”, modificar a estrutura de salário e ambiente das empresas,
além de reorganizar o ensino brasileiro.
O êxodo de profissionais de TI deve ter quais
impactos na economia brasileira?
A distância entre a economia brasileira e as
mais avançadas do mundo já é muito grande. Se pegar a indústria, a distância na
área de tecnologia é gigantesca. Estamos em um estágio incipiente. O impacto é
que vamos ampliar ainda mais essa diferença. Esse é o grande problema da
tecnologia atual: os grandes avanços não acontecem em todos os países e, mesmo
nos países avançados estão concentrados nas principais universidades e
empresas. O centro motor dessas inovações tem de ser ampliado. Caso contrário,
vai gerar uma desigualdade maior no mercado de trabalho, no sistema educacional
e nos salários.
O que as empresas e o governo podem fazer
para reter profissionais de TI?
Como esse movimento de digitalização é recente,
parte das empresas não está preparada: não tem uma carreira montada e o
profissional muitas vezes é submetido a chefias que não entendem o que ele
propõe. Sem um ambiente empresarial adequado para abrigar os profissionais, a
produtividade e o grau de inovação são baixos. Carreira significa uma
remuneração progressiva e vinculada ao tipo de resultado que esse profissional
dá. Salário, ambiente, estrutura de comando adequada, com gente qualificada,
capaz de compreender o grau de sofisticação do que está sendo proposto. Grandes
profissionais não saem necessariamente por salário. Saem porque têm desafios e
estruturas diferentes. Os profissionais têm de ser desafiados permanentemente.
Tem gente que chama isso de problema cultural das empresas brasileiras. A
economia brasileira não inova muito. Tudo isso está ligado com o que o mercado
se dispõe a pagar. Uma empresa só vai aumentar salários se precisar de
profissionais com qualidade. Se a minha intenção é fazer algo superficial, numa
escala de inovação de uma a dez, quero fazer algo dois, por que vou pagar esse
profissional?
Como mudar isso?
A economia tem de aumentar o nível de
digitalização. Isso é lento e não é fácil.
O País tem preparado profissionais para isso?
Um trabalho multidisciplinar é fundamental nessa
área hoje. Ninguém faz um trabalho puramente de estatística, é preciso também
fortalecer todas as áreas de ensino. A CNI (Confederação Nacional da
Indústria), com todos seus problemas, tem grupos de trabalho com escolas e com
as principais universidades tratando das qualidades das engenharias. Claro que
é mais difícil mudar aqui do que em países que já têm tradição em educação
orientada. Aqui há uma resistência grande das nossas escolas, mas tem de mudar.
As escolas vão formar cada vez mais gente que não vai encontrar onde trabalhar.