Negociação entre governo e Caixa trava programa habitacional
Banco resiste à mudança, sobretudo num momento em que seu caixa já está pressionado pelas medidas adotadas na crise
Na tentativa de ampliar o número de novos financiamentos
pelo Minha Casa Minha Vida, o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) tem
encarado uma negociação dura com a Caixa, para diluir o pagamento dos subsídios
a duas faixas do programa habitacional ao longo do prazo dos contratos, que podem
durar até 30 anos. Segundo apurou o Estadão/Broadcast, o banco resiste à
mudança, sobretudo num momento em que seu caixa já está pressionado pelas
medidas adotadas na crise.
O impasse acabou travando as negociações do novo
programa habitacional, chamado provisoriamente de Casa Verde Amarela e que será
uma das frentes da nova política social da gestão Jair Bolsonaro. Fontes do
governo contavam em lançar o novo Minha Casa no fim de junho, o que não vai se
confirmar.
O entrave se soma à dificuldade da pasta em conseguir convencer a área
econômica a reduzir as taxas de juros praticadas nesses financiamentos. Como
mostrou o Estadão/Broadcast, o FGTS resiste porque a cobrança de um juro
menor afetará a rentabilidade do fundo, que também está com o caixa sobrecarregado
pelas ações de socorro durante a pandemia. O MDR quer agora viabilizar ao menos
uma redução nos juros para famílias no Norte e no Nordeste, onde Bolsonaro
tenta ampliar sua base de eleitores. A expectativa é que o assunto seja levado
ao Conselho Curador do FGTS na próxima reunião, em julho.
Os financiamentos das faixas 1,5 e 2 do Minha
Casa, que contemplam respectivamente famílias com renda até R$ 2,6 mil e R$ 4
mil, são concedidos com juros subsidiados, ou seja, abaixo do praticado pelo
mercado. Essa subvenção é bancada pelo FGTS. Dos R$ 9 bilhões previstos este
ano para os subsídios do Minha Casa, cerca de R$ 6 bilhões serão repassados ao
banco em forma de subvenção.
O problema, na visão do governo, é que a Caixa
recebe à vista o valor do subsídio referente a parcelas e juros de períodos
ainda não decorridos, uma vez que o contrato de financiamento tem prazo de até
30 anos. Os defensores da mudança sustentam que o banco deveria receber os
valores da subvenção no mesmo ritmo do vencimento das parcelas, ao longo do
contrato. Na prática, esse formato abriria espaço para que o valor reservado
aos subsídios no orçamento do FGTS financiasse ainda este ano um número maior
de aquisições de imóveis.
A Caixa é contra a mudança porque a medida
poderia desfalcar suas reservas e comprometer os resultados do banco num
momento em que a instituição já está pressionada pelas pausas de até 120 dias
no pagamento de financiamentos, inclusive imobiliários, concedidas a clientes.
Segundo apurou a reportagem, a Caixa deixou de
cobrar as parcelas dos financiamentos imobiliários, mas continua efetuando as
devoluções previstas ao FGTS nos contratos que têm recursos do fundo como fonte
de financiamento.
Críticos dentro do governo afirmam que a Caixa
adotou a pausa de maneira indiscriminada, concedendo o benefício inclusive para
servidores públicos que continuam recebendo seus salários normalmente, e isso
acaba diminuindo o poder de fogo do banco em outras frentes.
TCU
O pagamento à vista do subsídio já foi alvo de
questionamentos no Tribunal de Contas da União em 2016, após estudo da
consultoria do Senado apontar que o balanço da Caixa estava sendo inflado pelas
receitas da subvenção. Na época, detectou-se que a Caixa contabilizava todo o
recurso como receita operacional de forma imediata, antes mesmo das
contratações. Segundo o TCU, a impropriedade contábil foi corrigida ainda em
2016, mas o banco continua recebendo os valores à vista.