Contradições
A nossa capacidade linguística – que ao longo do tempo foi transformada nas artes da oratória e da escrita, agora consideravelmente perdidas – nos serve para diversos objetivos, cada um deles resultando de um tipo de linguagem: a expressão de um raciocínio certo (lógica), a procura do que é de fato verdade em meio às muitas e contraditórias opiniões (dialética); e a busca de uma forma de expor para persuadir o outro, para conquistar corações e mentes (retórica).
Esses três usos da linguagem, embora diferentes, podem se complementar e enriquecer mutuamente, pois todos têm suas limitações. Por exemplo, um dos grandes defeitos da retórica surge quando ela é usada sem a preocupação com a busca da verdade (dialética) e sem a atenção ao rigor do raciocínio (lógica); quando o único objetivo de quem escreve ou fala é convencer, persuadir o leitor ou ouvinte, independentemente da realidade, sem levar em conta o que é e o que não é verdade.
Não raro, os “retóricos” nesse sentido acabam por cair em contradições. É o que parece acontecer com os advogados de defesa de Lula, que apresentaram embargos de declaração, contestando a condenação do seu cliente pelo juiz Sérgio Moro, que respondeu: “A seguir o critério da defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, os diretores da Petrobras Paulo Roberto Costa, Renato de Souza Duque e Nestor Cuñat Cerveró, que mantinham contas secretas com saldos milionários no exterior e confessaram seus crimes, também deveriam ser absolvidos”.
Moro ainda escreveu: “Mais de uma vez consignou-se que, na apreciação de crimes de corrupção e lavagem, o juízo não pode se prender unicamente à titularidade formal. Assim não fosse, caberia, ilustrativamente, ter absolvido Eduardo Cosentino da Cunha (…) pois ele também afirmava como álibi que não era o titular das contas no exterior que haviam recebido depósitos de vantagem indevida, mas somente ‘usufrutuário em vida'”. Será que os petistas estariam abertos a defender para Cunha o critério que defendem para Lula?
Como o próprio Moro afirmou, o pedido da defesa de Lula, se aprovado por outras instâncias da Justiça, vai abrir precedentes perigosos. Tudo porque, na visão dos advogados, o que vale não é a lógica ou a verdade, e sim o convencimento e a persuasão pura e simples.