Após W.O. e quebra de contrato, Figueirense manterá aposta em clube-empresa
“O ano de 2019 jamais
será esquecido”. A classificação da temporada como histórica para um clube
perto de comemorar o centenário vem de Francisco de Assis, que preside
interinamente o Figueirense após a equipe passar por turbulências que colocaram
em dúvida a sua sequência, mas que encerrou a participação na Série B do
Campeonato Brasileiro no último sábado, 30, em festa pela improvável
permanência na segunda divisão.
Clube ascendente no futebol nacional no século
XXI, sendo finalista da Copa do Brasil em 2007 e só ficando fora do Brasileirão
em três oportunidades entre 2002 e 2016, o Figueirense enfrentou um colapso em
2019. Vivenciou greve de jogadores, com recusa a participação em treinos e, no
ponto mais alto da crise, o W.O. diante do Cuiabá, em 20 de agosto, por atrasos
salariais e falta de cumprimento de promessas pela gestora do clube. “Me
arrisco a dizer que o Figueirense esteve próximo do fechamento. Pode parecer
exagero, mas não é, porque a situação era bem grave, de quase solvência”,
relembrou Assis, em entrevista ao Estado.
Afundado na lanterna do torneio nacional, o
Figueirense rompeu a parceria com a Elephant, empresa responsável por administrar
o departamento de futebol. E mesmo com os cofres vazios, como acusam os
dirigentes do clube, conseguiu emplacar uma sequência de bons resultados que o
manteve na Série B. “Pode ser estranho comemorar a permanência, mas para
nós é como se fosse um título. É emblemática essa demonstração de força e
potencial”, disse Assis.
A quebra do contrato com a Elephant é visto como
principal passo para o resgate do Figueirense na Série B. A rescisão se deu em
20 de setembro, com Assis assumindo a presidência do clube e funções que eram
de Claudio Honingman, gestor da empresa para gerir o time.
A história da transformação do Figueirense em
empresa, porém, se deu bem antes, ocorrendo em 2015. A Elephant surgiu como
alternativa em 2017, com a assinatura de contrato em agosto. Desde o início
dessa parceria, porém, houve dificuldades. No final do primeiro semestre, o
clube notificou a empresa para cumprir os itens do contrato, seguido pela
assinatura de termo em que a Elephant se comprometia a colocar as contas em
dia. Como isso não foi cumprido, o Figueirense destituiu Honigman e a empresa,
através da Justiça.
“Ele negociou jogadores com o Athletico-PR
e recebeu R$ 2 milhões, em uma operação que não tínhamos conhecimento. Só que
os jogadores souberam, exigiram o pagamento dos atrasados,deles, dos
funcionários, da base e da comissão técnica, que dava cerca de R$ 700 mil. Não
havia razão para que o pagamento não fosse feito. Por isso, os jogadores se
recusaram a jogar”, afirmou Assis, relembrando o W.O. contra o Cuiabá.
“Foi uma queda de braço que ele perdeu. Aí entramos com o processo de
rescisão do contrato”, acrescentou.
A REAÇÃO
– Aos poucos se iniciou uma
recuperação, que contaria com momentos tensos, a ponto de a Elephant ter
protocolado documento na CBF comunicando que o Figueirense abandonaria a Série
B por falta de recursos financeiros – o STJD o considerou inválido, pois a
empresa já não era a gestora do futebol do clube.
A torcida, comovida e preocupada, abraçou o
Figueirense. Em 24 de setembro, apenas quatro dias após o rompimento com a
Elephant, quase 10 mil pessoas foram ao estádio Orlando Scarpelli e aplaudiram
os jogadores mesmo com a derrota por 3 a 0 para o Bragantino. E os sete maiores
públicos como mandante na Série B foram registrados após o rompimento do acordo.
Em campo, a resposta demorou um pouco a vir,
como o time perdendo três jogos consecutivos. Mas ocorreu na sequência, tanto
que o Figueirense emplacou uma série invicta de 12 jogos, ainda que com muitas
igualdades – foram 20 em 38 rodadas. Durante esse período, retornou Pintado,
treinador que havia dirigido o time em 2008. E não perdeu nesse retorno, com
duas vitórias e sete empates. Também foram importantes reforços que chegaram no
final da janela de transferências, assumindo a titularidade: o goleiro
Pegorari, os laterais Conrado e Luis Ricardo e os atacantes Breno e Jefferson
Renan. E apoiados pelo brilho de jogadores que já estavam no elenco, como o
experiente Rafael Marques, autor de três gols na reta final da Série B.
O ponto alto da reação se deu em 22 de novembro.
Naquela data, ao segurar o placar em 0 a 0 com o CRB pela penúltima rodada da
Série B, o Figueirense rebaixou quatro times de uma vez para a terceira divisão
nacional: Londrina, São Bento, Criciúma e Vila Nova.
O FUTURO
– Os desafios, porém, não se encerram
com o fim da temporada. O clube deve passar por desmanche do elenco, pois só 11
dos 36 jogadores possuem contrato para 2020. E com restrições financeiras, deve
perder destaques da campanha que estavam emprestados ao time como Pegorari, do
Ituano, e Fellipe Matheus e Tony, da Ferroviária. Além disso, a diretoria ainda
deve dois meses de direitos de imagem a nove atletas. “Fizemos mutirões
para captar recursos com conselheiros e amigos para resolver as questões mais
urgentes, como os compromissos salariais”, explicou Assis.
O dirigente também destaca que o Figueirense,
até por seu pioneirismo, manterá a aposta no modelo de clube-empresa,
acreditando que o problema se deu pelo que vê como má-fé de Honigman. “O
Figueirense buscou esse modelo de gestão por acumular dificuldades financeiras
que não podia suportar”, disse
Nesse sentido, a aprovação do projeto
clube-empresa na última semana na Câmara dos Deputados agrada ao Figueirense,
especialmente por permitir o parcelamento de débitos em até 150 meses, com a
comodidade de reduzir as multas em 70% e os juros em 40%. “É algo que nos
interessa, só tende a melhorar. A nossa empresa é convencional e a que está
sendo proposta pela legislação é específica para o futebol, com vantagens que
hoje não temos, principalmente envolvendo negociações das dívidas”,
afirmou o presidente em exercício.
O plano do Figueirense é voltar à elite em 2021,
como um marco da celebração do centenário. Na festa, 2019 terá seu espaço, por
memórias positivas e negativas. “Foi um período negro, atingiu a nossa
imagem”, admite Assis. “Por outro lado, houve uma impressionante
demonstração de força. A torcida abraçou o clube de modo inédito, com uma
corrente de solidariedade e é algo a ser comemorado”, concluiu o
dirigente.