Aposentados da Alesp têm bônus por desempenho
Eles
estão aposentados. Mas recebem todo mês um bônus por desempenho da
Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). Nos últimos 12 meses,
saíram dos cofres públicos R$ 360.683,16 para pagar gratificações
a servidores que não trabalham mais no Estado. Os 42 ex-funcionários
da Alesp conseguiram acesso ao benefício por meio de decisões
judiciais do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) anteriores a
2014.
Criada por lei complementar em 2007 e conhecida pela sigla
GED, a gratificação especial de desempenho é um benefício pago a
alguns servidores da Alesp, para premiar, em tese, resultados
positivos do seu trabalho. A distribuição da gratificação, no
entanto, não está atrelada a avaliações ou índices de
produtividade dos funcionários. Todo mês, a Casa separa uma cota de
bônus para distribuir aos servidores que estão na ativa. Cabe às
lideranças de cada partido escolher quem vai receber a gratificação
e quanto vai ganhar.
Já os aposentados recebem por decisão
judicial sempre o mesmo valor – 41 ganham o piso (R$ 589,35) e apenas
um recebe o valor máximo (R$ 5.893,58).
Histórico
A
ideia de gratificações por desempenho começou a aparecer no
serviço público a partir de 1998, com a reforma administrativa, que
deu mais autonomia de gestão orçamentária a órgãos públicos.
Bonificações foram criadas em vários níveis do funcionalismo e
aposentados passaram a buscar, na Justiça, acesso ao mesmo tipo de
gratificação. O argumento mais comum nas ações é o de que deve
haver paridade entre a remuneração de servidores ativos e inativos.
O excesso de processos fez a discussão chegar ao Supremo Tribunal
Federal (STF).
Ao analisar, em 2007, uma gratificação
concedida a servidores federais, a Corte gerou uma súmula
vinculante. A norma dizia que, quando não há processos individuais
de avaliação de desempenho, as gratificações funcionam, na
prática, como um aumento salarial. Logo, deveriam ser recebidas
também pelos aposentados, em respeito à norma de paridade. Esse
entendimento foi seguido pela Justiça paulista até
2014.
Processos
As
ações individuais de servidores aposentados da Alesp foram
assinadas por advogados indicados por uma associação que representa
funcionários públicos inativos em São Paulo. O Estado não
localizou os defensores. A relação dos 42 servidores aposentados
que recebem a GED foi fornecida pela Alesp a pedido do Estado. As
sentenças concedidas a esses ex-funcionários mostram que juízes
paulistas seguiram o entendimento do Supremo de que, como não há
avaliação individual, o bônus de desempenho faz parte do salário
dos servidores estaduais.
Questionada sobre o pagamento do
benefício, a Assembleia informou que a GED “se destina à
valorização de servidores em razão do desempenho e eficiência”.
Segundo o Legislativo paulista, “a vantagem não apresenta
caráter geral, ou seja, não é – e nunca foi – paga a todos os
servidores da ativa”.
Para a Alesp, como a gratificação
não é paga a todos os servidores, ela não pode ser considerada um
aumento salarial e, portanto, a regra da paridade não deveria
valer.
A partir de 2014, o TJ-SP passou a negar a concessões da
GED a inativos com base nesse entendimento. Mas quem já tinha
conseguido autorização judicial, continua recebendo. “É
razoável (que a Justiça não esteja mais decidindo que aposentados
devem ter essa gratificação), uma vez que não são todos os
servidores da ativa que recebem”, diz Jacintho Câmara,
professor de direito administrativo da Faculdade de Direito da PUC-SP
e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Direito Público.
Como
não há avaliação, cabe aos próprios deputados estaduais decidir
quem vai receber o pagamento extra. Até 2018, cada parlamentar tinha
uma cota de quase R$ 9 mil. Em 2019, a distribuição passou a ser
prerrogativa das lideranças partidárias, e a cota é dividida de
forma proporcional, conforme o número de deputados.
De acordo
com especialistas em direito administrativo, a falta de avaliações
de performance pode levar a GED até a ser considerada
inconstitucional. “Fica uma avaliação subjetiva, que em
direito administrativo se chama de discricionária”, afirma
Câmara. “Conferir mais essa discricionariedade me parece
inadequado do ponto de vista da técnica da administração. Está
dando poder a uma pessoa decidir quem vai ganhar mais ou menos”,
acrescenta o professor da PUC.
Críticos à GED salientam ainda
que ela pode ser usada para facilitar a prática da rachadinha,
quando deputados recolhem parte da renda de seus servidores para
custear despesas do gabinete ou para outras finalidades. “Em
tese, se algum deputado pratica rachadinha, ele terá um incentivo
econômico para não usar essa gratificação para aquele servidor
que fez o pacto com ele”, diz Câmara.
Natal
Em
dezembro, o TJ-SP suspendeu o pagamento de cerca de R$ 10 milhões
com um bônus natalino a 3.266 servidores da Alesp. O abono viria
embutido no auxílio-alimentação do mês de dezembro, o que,
segundo a Justiça, pode ser entendido como desvio de finalidade. O
vale-refeição tem caráter de reembolso e não tem incidência de
imposto de renda e contribuição previdenciária.