Mello vai assistir ao vídeo e decisão sobre sigilo fica para próxima semana
O ministro Celso de
Mello, decano do Supremo Tribunal Federal, irá assistir pessoalmente ao vídeo
da reunião ministerial do dia 22 de abril, peça-chave do inquérito que apura
suposta tentativa de interferência do presidente Jair Bolsonaro na Polícia
Federal. Com isso, a decisão sobre a liberação total ou parcial da gravação
deverá ficar para a próxima semana.
O decano deverá assistir à gravação na próxima segunda-feira (18) e somente
depois irá decidir pelo levantamento do sigilo. Celso de Mello já tem uma visão
geral do teor da reunião, feita a partir do relato do juiz federal auxiliar
Hugo Sinvaldo Silva da Gama Filho, mas quer ver a íntegra antes de tomar uma
decisão.
O procurador-geral da República Augusto Aras e o Advogado-Geral da União se
manifestaram pela divulgação parcial da gravação, somente de falas do
presidente Jair Bolsonaro. O PGR foi ainda mais restrito quanto ao vídeo,
pedindo ao decano do Supremo que libere somente as falas do presidente
relacionadas ao objeto do inquérito que tramita no STF.
Já a defesa de Moro, defende que a divulgação integral do conteúdo
caracterizará verdadeira lição cívica, por se tratar de um ato oficial do
governo.
O vídeo está sob sigilo temporário por ordem do decano desde o dia que foi
entregue pelo Planalto na sexta, 8. Na terça, 12, foi exibido no Instituto
Nacional de Criminalística da corporação em Brasília, em ato único, a Moro,
advogados do ex-ministro, integrantes da Advocacia-Geral da União, procuradores
e investigadores que acompanham o caso.
Fontes que acompanharam a exibição do vídeo avaliaram que o conteúdo da
gravação escancara a preocupação do presidente com um eventual cerco da Polícia
Federal a seus filhos.
O presidente aparece no vídeo chamando a superintendência fluminense da PF de
segurança do Rio, segundo relatos. Os investigadores avaliam que o material é
devastador para o presidente. “O vídeo é ruim para Bolsonaro, muito
ruim”, anotou uma das fontes que teve acesso ao conteúdo.
Tratada agora como sigilosa pelo governo, a reunião ministerial de 22 de abril,
a última com o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro, foi presenciada por ao menos
40 pessoas. Os “segredos de Estado”, conforme alega o governo, foram
conversados na presença de todo o primeiro escalão, presidentes de bancos
públicos, assessores especiais, ajudantes de ordens, cinegrafista e fotógrafo.
Pareceres
Após a exibição do vídeo na terça, Celso de Mello deu 48 horas para que Moro, a
AGU e a PGR se manifestassem sobre o levantamento do sigilo do material.
A primeira manifestação entregue foi a de Moro, na qual o ex-ministro
argumentou que pediu a divulgação da íntegra do vídeo da reunião ministerial do
dia 22 de abril, ou ao menos que, sejam publicitadas todas as falas do
presidente durante tal reunião. Segundo os advogados de Moro, por se tratar de
um ato oficial do governo, a divulgação integral do conteúdo caracterizará
verdadeira lição cívica.
No documento enviado ao Supremo, os advogados de Moro alegam ainda que a
divulgação integral do conteúdo da gravação permitirá verificar que as
declarações do Presidente da República foram direcionadas ao Ministro da
Justiça.
Já o parecer da AGU foi entregue na tarde desta quinta, 14, no sentido de que
seja levantado o sigilo de todas as falas do presidente constantes no registro,
preservadas referências a eventuais e supostos comportamentos de nações amigas
e as manifestações dos demais participantes da reunião.
No documento, a AGU transcreveu falas no presidente, inclusive que apresentam
as palavras família e PF. Bolsonaro afirmou e reiterou à imprensa que não havia
menção à Polícia Federal no vídeo.
“Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro oficialmente
e não consegui. Isso acabou. Eu não vou esperar ‘f. .’ minha família toda de
sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na
ponta da linha que pertence à estrutura. Vai trocar. Se não puder trocar, troca
o chefe dele não pode trocar o chefe: troca o Ministro. E ponto final. Não
estamos aqui para brincadeira”, afirmou o presidente na ocasião, conforme
transcrição da AGU.
Bolsonaro disse aos auxiliares na reunião ministerial que não pode ser
“surpreendido com notícias”. “Pô, eu tenho a PF que não me dá
informações; eu tenho as inteligências das Forças Armadas que não têm
informações; a ABIN tem os seus problemas, tem algumas informações, só não tem
mais porque ‘tá faltando realmente temos problemas aparelhamento, etc. A gente
não pode viver sem informação.”
“Me desculpe o serviço de informação nosso – todos – é uma vergonha, uma
vergonha, que eu não sou informado, e não dá para trabalhar assim, fica
difícil. Por isso, vou interferir. Ponto final. Não é ameaça, não é
extrapolação da minha parte. É uma verdade”, afirmou Bolsonaro, segundo
manifestação da AGU.
A manifestação de Aras foi a última a ser enviada ao decano, na noite desta
quarta, 14. O PGR defendeu a divulgação apenas de falas do presidente
relacionadas ao objeto do inquérito – declarações que tratam da atuação da Polícia
Federal, da segurança, do Ministério da Justiça, da Agência Brasileira de
Inteligência e da alegada falta de informações de inteligência das agências
públicas.
Segundo o chefe do Ministério Público Federal, a divulgação da íntegra do
material o converteria em arsenal de uso político, pré-eleitoral, de
instabilidade pública e de proliferação de querelas e de pretexto para
investigações genéricas sobre pessoas, falas, opiniões e modos de expressão
totalmente diversas do objeto das investigações.