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“Prefeituráveis não podem vender sonhos”, diz Guilherme Rezende

Analista eleitoral avisa que um diagnóstico real dos problemas da cidade e a apresentação de soluções factíveis são o melhor caminho

27/09/2020 08h14 - Atualizado há 4 anos Publicado por: Redação
“Prefeituráveis não podem vender sonhos”, diz Guilherme Rezende Foto: Arquivo Pessoal / Guilherme Rezende

Guilherme Rezende é bacharel e mestre em Administração Pública (UNESP/FGV), fez intercâmbio na Universidad Santiago de Compostela (Espanha) e atua como consultor/pesquisador em políticas públicas e campanhas eleitorais. Nesta entrevista ele nos fala das eleições e faz alguns alertas para quem deseja vencer o pleito. Posar de “vendedor de sonhos”, segundo ele, será uma péssima opção.

PRIMEIRA PÁGINA  – São Carlos tem 12 candidatos. A que se deve isso: troca de gerações, excesso de vaidade ou mudanças na legislação eleitoral e fundo partidário?

GUILHERME REZENDE – Entendo que um dos fatores preponderantes para esse grande número de candidatos observado em São Carlos e em outras cidades decorre também das mudanças na legislação eleitoral, em especial, o fim das coligações proporcionais (neste caso, para vereadores) e a necessidade dos partidos se fortalecerem nos municípios já pensando nas eleições de 2022 e, consequentemente, na distribuição do tempo de TV e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), mais conhecido como “Fundo Eleitoral”. Há também que se considerar a aparente dificuldade em se fazer composições político-partidárias, cenário este que favorece candidatos mais conhecidos, e também uma mudança geracional no quadro político da cidade.

PP -Um número maior de candidatos significa mais democracia pelo maior número de alternativas ao eleitor ou um cenário complicado para quem vai escolher um candidato com um bom projeto?

GR – Os dois. Se por um lado é possível que tenhamos maior “pluralidade” nos pontos de vista e planos políticos para a cidade, de outro lado, esse grande número de opções pode dificultar a escolha pelo eleitor, sobretudo se as diferenças de pensamento e trajetória dos postulantes à Prefeitura e Câmara não ficarem evidentes.

PP – O que deve ter um bom projeto de cidade na campanha do candidato?

GR – Minha opinião é que todo bom plano parte de um bom diagnóstico dos problemas locais, feito com dados de maneira técnica e também pela escuta ativa da população que realmente sente os problemas na pele. Posteriormente, esses problemas precisam ser atacados com propostas factíveis, preferencialmente, embasadas em referências que deram certo em outras cidades e na realidade orçamentária da prefeitura. Por fim, não é possível dissociar totalmente o plano do grupo político, assim sendo, é necessário que aquele candidato e seu grupo político também tenham trajetórias e referências que estejam vinculadas com os projetos propostos no plano.

PP – São Carlos tem programas de TV. Como um bom programa televisivo pode cativar o eleitor em tempos de redes sociais?

GR – As redes sociais dinamizaram substancialmente a comunicação e o marketing político, entretanto, ainda é bastante desejável para qualquer candidato ter um bom tempo e bons programas de TV, mostrando sua trajetória e propostas para a cidade. Entretanto, temos exemplos que somente esse espaço na TV seja insuficiente para eleger um candidato ou torna-lo competitivo, como ocorreu nas eleições de 2018. Além disso, fica o aprendizado que mostrar na TV candidatos “perfeitos” ou “cidades dos sonhos” tem sido motivo de crítica por eleitores e ataques de adversários. Autenticidade, conexão real com os problemas da população e mostrar conhecimento de como resolvê-los pode ajudar a cativar eleitores.

PP – A campanha de 2018 foi ideologizada e dividiu o Brasil entre democratas e os saudosistas do autoritarismo. Numa campanha municipal há lugar para ideologia?

GR -Sim, há. Entretanto, as eleições municipais tem traços fortes da discussão de problemas locais, onde ideologias que discutem temas de costumes, por exemplo, podem não vir ao encontro dos anseios de parte do eleitorado (saúde, educação, saneamento, etc.), sobretudo, para substantiva parcela da população que não possui uma identificação ideológica definida.

PP – No meio de tantos nomes e tanta sopa de letrinhas e etc como um candidato a vereador pode se sobressair? E o eleitor? Como fará para escolher o seu vereador na hora de votar?

GR – É esperado que o número de candidatos a vereador seja maior que em 2016, aumentando o leque de opções dos eleitores. Vejo a eleição proporcional como uma “eleição de nicho”, ou seja, penso que os candidatos devam buscar identificar muito bem quais são seus públicos preferenciais e atuar de maneira estruturada nesses locais. Geralmente dividimos os candidatos com características mais territoriais (focadas num bairro/região) ou de opinião (voltados para um tema/grupo). Em 2016, os vereadores eleitos tiveram entre 1 a 2,6% dos votos válidos, o que reforça nossa análise.

O eleitor precisa compreender que ao votar no candidato ele também está votando naquele partido e que indiretamente pode estar colaborando para a eleição de um outro candidato daquela mesma sigla, assim sendo, é oportuno conversar com seu candidato sobre a chapa.
O eleitor também deve ficar atento com o que um vereador constitucionalmente pode fazer, sendo competência do vereador a fiscalização da Prefeitura e a proposição/análise de leis que são de interesse do município. O cargo de vereador não permite asfaltar ruas, oferecer vagas em escolas ou cirurgias, uma vez que essas são atribuições da Prefeitura devidamente organizadas em Lei. Sugiro também que os eleitores se organizem em bairros, temas ou coletivos para escolher e até ajudar na eleição de determinado candidato.

PP – Talvez o maior desafio de São Carlos e de toda a região para 2021 seja a geração de empregos. Como gerar postos de trabalhos num cenário totalmente adverso após a Pandemia?

GR – Apesar da complexidade do tema, na minha avaliação essa deveria ser uma das questões centrais de qualquer candidato à Prefeitura. Considero que quem gera empregos é o setor privado e a Prefeitura deve buscar incentivar o empreendedorismo, assim sendo, penso que é oportuna a revisão da burocracia e alta digitalização no estabelecimento de empresas (Alvará, Leis de Zoneamento, etc.) levando em conta também atualização do código tributário buscando reduzir taxas e impostos, respeitando a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Não menos importante, a efetivação de um conselho que envolva universidades, o empresariado, a sociedade civil e o poder público pode ajudar a estabelecer, implementar e avaliar um plano de desenvolvimento para a cidade, a exemplo do CODEM (Conselho de Desenvolvimento de Maringá, no Paraná).

Entretanto, medidas de atração de novas empresas e criação de empregos também são de atribuição estadual e federal, e levam tempo para surtir efeito, assim sendo, os candidatos devem ponderar políticas públicas para fortalecimento da rede de Assistência Social e da qualificação profissional, projetos como o “Bolsa-Trabalho” (Guarulhos), o “JEPOM” (São Vicente) e o Bolsa Cidadania (Araraquara) podem nortear propostas que caibam na realidade de São Carlos. A tarefa da retomada econômica não é fácil, entretanto, não tenho dúvidas que a comunidade são-carlense tenha excelentes ideias para enfrentar esse problema e os candidatos devem estar aptos a ouvir e implementar essas propostas.

PP – A EPTV ameaça não realizar o debate devido ao grande número de candidatos. Até onde um debate pode ou não decidir uma eleição?

GR – Os debates são parte muito relevante do processo democrático quando pautados em ideias e nas propostas. Nessas situações também é possível verificar se o candidato consegue explicar de maneira direta sua visão dos problemas e propostas sobre diversos temas, inclusive quando confrontado por seus adversários. Os debates são muito relevantes para que a população conheça os candidatos para além de suas peças de marketing da TV ou redes sociais, e historicamente tem influências substantivas na decisão do voto, sobretudo nas últimas semanas. Espero que os veículos de comunicação e os candidatos desenvolvam consensos para viabilizar entrevistas e debates sobre o futuro de nossa cidade.

PP – Suas considerações finais.

GR – A eleição que definirá os próximos 4 anos de nossa cidade já começou, busque desde já saber quem são os candidatos para Prefeitura e Câmara, converse com seus amigos e familiares sobre as eleições que se aproxima. Organize-se em grupos e coletivos, façam propostas e exigências de compromissos aos candidatos e, no dia da eleição, seguindo as recomendações sanitárias, não deixe de exercer seu direito de voto.

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