Renovação já contabiliza 71 pré-candidatos em capitais
O
interesse crescente pelos grupos e movimentos de renovação e
formação política no País vai se refletir nas eleições
municipais deste ano.
Em 2019, com a persistente crise de
representatividade dos partidos tradicionais, o número de alunos e
apoiadores destes grupos se multiplicou. O fenômeno deverá resultar
em um boom de candidaturas majoritárias associadas a organizações
suprapartidárias que formam lideranças ou que buscam renovar a
prática política, segundo levantamento do Estado.
Faltando
nove meses para as eleições municipais, ao menos 71 egressos desses
movimentos civis já manifestaram interesse em concorrer em capitais
de ao menos 21 Estados. A participação em grupos de formação
política se tornou uma credencial para candidaturas, o que leva
partidos a disputarem os novatos oferecendo estrutura material e
suporte.
Em um dos poucos movimentos que já existia em 2016, a
Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps), o número de
interessados em disputar as prefeituras das capitais até agora já é
maior do que o total de candidatos ligados ao grupo que disputaram a
eleição de 2016, incluindo na conta as cidades menores. Segundo o
grupo, 49 dos inscritos querem estar nas urnas em outubro. Em 2016,
saíram da Raps 22 candidatos a prefeito, oito deles em
capitais.
Para alguns pré-candidatos, os grupos civis são uma
forma de driblar a falta de contatos nos partidos políticos para se
apresentar ou de recursos financeiros para tocar uma campanha. “As
pessoas têm medo de ir para a política”, afirmou ao Estado
Charbel Elias Maroun, pré-candidato do Novo à prefeitura do Recife.
“Primeiro, porque acham que é caro e que tem que gastar muito
dinheiro – e eu não as culpo porque é isso o que a gente tem visto.
Segundo, porque elas acham que não têm o apoio de ninguém.”
Maroun
estreou nas urnas em 2018, após integrar a primeira turma do
RenovaBR, apoiado pelo apresentador de TV Luciano Huck – cotado como
possível candidato à Presidência em 2022. Ele gastou R$ 70 mil na
campanha, conquistou 22 mil votos, mas não garantiu a vaga de
deputado federal. A candidatura de Maroun é quase certa, já que o
Novo fez um processo seletivo para definir seus nomes e ele é o
único aprovado para disputar a prefeitura do Recife. Falta apenas a
confirmação da convenção municipal. “Fui submetido a provas,
a testes, a headhunters e tudo mais”, destacou.
Embate
O
desconforto com antigas práticas partidárias é outro fator que
empurra jovens políticos ou aspirantes a políticos para os grupos
de renovação. O médico João Guilherme de Moraes diz ter se
frustrado em sua primeira tentativa de entrar no Executivo municipal,
em 2016. Vice na chapa que foi ao segundo turno na disputa pela
prefeitura de Curitiba, ele se queixa de coligações que unem siglas
sem afinidade programática em busca de tempo de TV. “Atrapalha
a estrutura partidária e essa questão de as agremiações no Brasil
terem dono”, afirmou.
Moraes, então no PSC, concorreu com
Ney Leprevost (PSD) e foi derrotado. “Eu voltei às atividades
do consultório, mas com desejo de retornar (à política)”,
disse. Após passar pela última turma do RenovaBR, ele também se
filiou ao Novo. Além de Maroun e Moraes, o grupo contabiliza outros
12 pré-candidatos a capitais que fizeram em 2019 o curso de
qualificação para atuar na esfera municipal. Ao todo, 1.170 pessoas
de 410 cidades se formaram na última turma do RenovaBR, divididas em
30 dos 33 partidos que existem hoje no Brasil.
O movimento,
alegando alta procura, decidiu abrir novo processo seletivo no início
deste ano para atender interessados em se candidatar a prefeito ou
vereador nas disputas municipais. Numa peça publicitária em que
anuncia os novos cursos, o RenovaBR conclama: “Seja a pessoa que
você quer eleger”.
O Livres, um movimento de viés
liberal, já tem seis associados pleiteando apoio às suas
pré-candidaturas a prefeito de capitais Um dos concorrentes é o
deputado federal Marcelo Calero (Cidadania-RJ), que deve se lançar
no Rio. Após ganhar fama em 2016, quando denunciou a pressão de
Geddel Vieira Lima, ex-ministro da Secretaria de Governo da
Presidência, para liberar uma obra em Salvador, ele se ligou a
vários grupos de renovação.
Depois de ganhar notabilidade nas
mobilizações de rua pelo impeachment da ex-presidente Dilma
Rousseff, o Movimento Brasil Livre (MBL) também já tem apresentado
nomes para as eleições municipais deste ano.
O Estado procurou
nos últimos dias outros grupos, como Acredito, Agora!, Vote Nelas e
Ocupa Política, que informaram não ter ainda uma lista prévia de
possíveis candidatos a cargos majoritários no País.
Nome
da ‘velha guarda’
Um
dos integrantes do Livres com intenção de se lançar em 2020 tem
perfil que destoa dos novos nomes que pretendem disputar as eleições
neste ano. Trata-se de Andrea Matarazzo (PSD), 63 anos, que acumula
passagens por mais de dez cargos nos três níveis de governo –
federal, estadual e municipal – em mais de 20 anos de vida
pública.
“É uma via de duas mãos”, disse Matarazzo,
que é sobrinho-neto do conde Francesco Matarazzo, sobre sua presença
ao lado de novatos que querem ingressar na política. “Posso
transmitir conceitos de liberdade econômica, transmitir a minha
experiência trabalhando no governo a essa juventude”, afirmou
ao Estado. Em contrapartida, disse, ele ganha ao se aproximar dessa
turma “competente” da renovação.
O político da
velha guarda vê nas cabeças arejadas do Livres um diferencial.
“Eles não são dogmáticos. Entendem que a formulação da
política pública pode ser feita pelo Estado e que a execução,
pelo privado. Mas sabem que o Estado vai estar presente em função
da altíssima desigualdade, que não será a economia de mercado que
vai resolver.”
Durante a entrevista, feita por telefone, a
ligação caiu duas vezes. Matarazzo aproveitou, então, para pregar
o receituário liberal: “É um caso típico de falta de
concorrência, né? As teles são grandes demais e de uma
ineficiência comovente: custo alemão com qualidade cubana”,
disse ao atender de novo a ligação.