Supremo julga novas ações que impactam a Lava Jato
Depois
de derrubar a possibilidade de prisão após condenação em segunda
instância, o Supremo Tribunal Federal (STF) pode impor nova derrota
à Lava Jato com um julgamento que marca uma espécie de duelo entre
o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-juiz Sérgio
Moro. Desde janeiro no comando do Ministério da Justiça e da
Segurança Pública, Moro é acusado por Lula de agir com
parcialidade ao condená-lo no caso do triplex do Guarujá (SP) e
depois entrar para a equipe do presidente Jair Bolsonaro. O veredicto
do Supremo ganha ainda mais relevância porque, se a sentença for
anulada, o petista ficará apto a disputar eleições.
Lula
deixou a prisão na última sexta-feira, após o Supremo rever o
entendimento que previa a execução antecipada de pena, mas está
inelegível, enquadrado pela Lei da Ficha Limpa. A Segunda Turma da
Corte deve retomar a discussão do caso até dezembro – na prática,
o humor político do País acaba influenciando o calendário das
sessões.
Embora o Supremo não seja a causa do confronto entre
os extremos, no atual cenário, o tribunal vai para o centro da
polarização com o julgamento de “Lula versus Moro”.
“Estamos num clima conflagrado no Brasil, onde tudo é binário.
Se o habeas corpus for concedido, vai reforçar o discurso de Lula de
perseguição política. Se for negado, vai acentuar o discurso
anti-Lula, de que ele é culpado e teve uma condenação justa. Uma
parcela expressiva da opinião pública ficará insatisfeita, seja
qual for o resultado”, afirmou o professor de Direito Penal da
Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP) Davi Tangerino.
Um
recurso de Lula contra sua condenação também está pendente de
análise no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pode ser afetado
pelo entendimento do Supremo. A avaliação de integrantes do STF
ouvidos é a de que os últimos acontecimentos enfraquecem o grupo
mais alinhado à Lava Jato no tribunal – uma ala capitaneada pelo
relator da operação, Edson Fachin, com o apoio dos ministros Luís
Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia.
O desgaste da Lava
Jato na Corte se aprofundou após a divulgação de mensagens
trocadas entre Moro e o coordenador da força-tarefa da operação em
Curitiba, Deltan Dallagnol. As conversas, reveladas pelo site The
Intercept Brasil, foram alvo de hackers. O comportamento do
ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot – que afirmou ao
Estadaõ ter planejado matar a tiros o ministro do STF Gilmar Mendes
– também pôs em xeque investigações do Ministério Público
Federal e sua reputação.
Mesmo ministros mais sensíveis à
opinião pública e alinhados ao discurso da Lava Jato de combate à
impunidade, como Cármen Lúcia, não toleram mais o que veem como
“excessos” de procuradores e juízes. Em agosto, por
exemplo, em um julgamento considerado “divisor de águas”
na Lava Jato, a Segunda Turma do STF anulou uma condenação que
havia sido imposta por Moro a Aldemir Bendine, ex-presidente do Banco
do Brasil e da Petrobras O caso marcou a primeira vez em que Cármen
divergiu de Fachin em julgamentos cruciais na Segunda Turma, conforme
levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo.
Suspeição
Agora,
após a mudança de entendimento do Supremo sobre a execução
antecipada de pena, as atenções do PT se voltam para o julgamento
em que a conduta de Moro vai passar pelo crivo dos ministros. A
defesa de Lula acusa o titular da Justiça de interditá-lo
politicamente ao levantar o sigilo de parte da delação premiada do
ex-ministro Antonio Palocci às vésperas do primeiro turno da
eleição presidencial.
A Segunda Turma do STF é composta por
cinco ministros. Cármen e Fachin já se posicionaram contra o pedido
de Lula, mas o placar pode sofrer uma reviravolta. Gilmar Mendes e
Ricardo Lewandowski devem se manifestar a favor do petista, deixando
para o ministro Celso de Mello, decano do Supremo, a definição do
polêmico tema
O jornal apurou que o decano tem demonstrado
incômodo com as revelações feitas pelo The Intercept Brasil e
indicado a possibilidade de acompanhar a divergência a ser aberta
por Gilmar, que já acusou Moro de agir como “coaching” da
acusação. “A resposta do poder público ao fenômeno criminoso
– resposta essa que não pode manifestar-se de modo cego e instintivo
– há de ser uma reação pautada por regras que viabilizem a
instauração, perante juízes isentos, imparciais e independentes,
de um processo que neutralize as paixões exacerbadas das multidões”,
disse Celso na quinta-feira passada.
A afirmação do ministro
foi interpretada no Supremo como sinal de que ele pode acompanhar
Gilmar e Lewandowski para declarar Moro suspeito, o que formaria
maioria a favor de Lula.
Dados
Em
outro julgamento com impacto na Lava Jato, no próximo dia 20, o
plenário do Supremo vai analisar a necessidade de autorização
judicial para o compartilhamento de dados sigilosos por órgãos de
fiscalização e controle, como a Receita e o antigo Coaf.
A
discussão interessa ao senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do
presidente Jair Bolsonaro. Em julho, o presidente do STF, Dias
Toffoli, determinou a suspensão de todas as investigações do País
que utilizavam dados detalhados de inteligência financeira. A
decisão ocorreu depois do pedido da defesa de Flávio, alvo de
inquérito do Ministério Público do Rio que apura a suspeita de
“rachadinha” – prática que consiste na apropriação de
parte dos salários dos servidores -, quando ele era deputado
estadual no Rio.
A expectativa de ministros é a de que a
liminar de Toffoli seja confirmada na próxima semana, mas
procuradores apostam em uma “modulação” para reduzir o
alcance do entendimento.