Toffoli recua e anula decisão que dava acesso a dados de 600 mil pessoas
O
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli,
decidiu voltar atrás e anulou nesta última
segunda-feira, 18, uma decisão dele mesmo que havia determinado que
o Banco Central lhe encaminhasse cópias de todos os Relatórios de
Inteligência Financeira (RIFs) produzidos nos últimos três anos
pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf),
rebatizado como Unidade de Inteligência Financeira (UIF). A decisão,
agora tornada sem efeito, foi duramente criticada por membros do
Ministério Público Federal e congressistas, que reforçaram as
articulações em torno de uma CPI da Lava Toga, que mira ministros
de tribunais superiores.
Em resposta à decisão de Toffoli, o
Banco Central havia autorizado o acesso do ministro às informações,
comunicando a existência de 19.441 relatórios com dados de quase
600 mil pessoas (412.484 pessoas físicas e 186.173 pessoas
jurídicas), incluindo autoridades com prerrogativa de foro
privilegiado.
“Diante das informações satisfatoriamente
prestadas pela UIF, em atendimento ao pedido dessa Corte, em
15/11/19, torno sem efeito a decisão na parte em que foram
solicitadas, em 25/10/19 cópia dos Relatórios de Inteligência
Financeira (RIFs), expedidos nos últimos 3 (três) anos. Ressalto
que esta Corte não realizou o cadastro necessário e jamais acessou
os relatórios de inteligência”, escreveu o presidente do
STF.
A decisão foi divulgada após Toffoli se reunir no STF com
o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, o
procurador-geral da República, Augusto Aras, e o ministro-chefe da
Advocacia-Geral da União, André Mendonça.
Toffoli também
havia determinado que a Receita Federal enviasse todas as
Representações Fiscais para Fins Penais (RFFP) elaboradas no mesmo
período. Essa parte da decisão do presidente segue em vigor no
momento, mas segundo a reportagem apurou, o ministro também deve
anular esse outro ponto.
Conforme revelou o Estadão/Broadcast,
por determinação de Toffoli, a Receita Federal encaminhou à Corte
dados fiscais sigilosos e provas obtidas em investigações contra
mais de 6 mil contribuintes, nos últimos três anos. Uma ala do
Supremo avalia que os abusos e excessos cometidos por agentes
públicos estão na Receita, e não no Coaf.
Voto
– O
presidente do Supremo está costurando um voto que imponha limites ao
compartilhamento de informações sigilosas pela Receita Federal e
pelo antigo Coaf, mas sem comprometer o combate à corrupção no
País, segundo a reportagem apurou. O tema será discutido pelo
plenário do STF nesta quarta-feira, 20.
A discussão, que deve
mais uma vez dividir o plenário do Supremo, interessa ao senador
Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro.
Relator do processo que discute o repasse de informações sigilosas
por órgãos de controle e inteligência, Toffoli determinou em julho
a suspensão de diversos procedimentos de investigação apoiados em
dados fiscais e bancários compartilhados sem o aval prévio da
justiça. Só no Ministério Público Federal (MPF), o saldo de casos
parados chegou a 935.
Uma das preocupações dentro do governo é
a de preservar a atuação do Coaf e da Receita. Para tratar do tema,
Toffoli se reuniu nesta segunda-feira com o presidente do Banco
Central, Roberto Campos Neto, o procurador-geral da República,
Augusto Aras, e o ministro-chefe da Advocacia-Geral da União, André
Mendonça. “Nós estamos tentando buscar uma solução que
atenda a todos em relação ao que vai ser votado na quarta-feira”,
disse Campos Neto.
O presidente do Supremo, por sua vez, está
buscando uma saída que não prejudique o combate à corrupção, mas
que ao mesmo tempo garanta a proteção de dados sigilos de cidadãos.
Segundo a reportagem apurou, Toffoli está levando em conta as
ponderações do grupo de trabalho da Organização dos Estados para
a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que demonstrou
preocupação com a liminar do ministro concedida em julho.
No
entorno do ministro e dentro de associações de magistrados, há
críticas à repercussão negativa com o despacho de Toffoli, que
determinou que a Receita encaminhasse à Corte dados fiscais
sigilosos e provas obtidas em investigações contra mais de 6 mil
contribuintes, nos últimos três anos. Toffoli também pediu que o
Banco Central lhe enviasse cópias de todos os relatórios de
inteligência financeira produzidos pelo antigo Coaf.
Para esse
grupo, não houve a mesma indignação quando o escândalo da “Vaza
Jato” revelou o uso de informações sigilosas da Receita – sem
aval da Justiça – por procuradores da Lava Jato. Além disso,
aliados de Toffoli alegam que o ministro não tinha conhecimento da
enorme quantidade de relatórios que acabaram encaminhados ao
Supremo.
Devassa
–
Em resposta a um pedido de esclarecimentos feito por Toffoli, Aras
informou que é “tecnicamente impossível” a PGR fazer
qualquer tipo de “devassa” em movimentações bancárias
alheias, “até porque sequer possui acesso a essas informações”.
De acordo com a PGR, ao longo dos últimos três anos, o Ministério
Público recebeu 972 relatórios do Coaf, “todos enviados de
forma espontânea”, pelo órgão.